Imagine um bicho. Um grande e cascudo inseto, parado na palma
da sua mão. Ele pode ter formato de coração, se você é o tipo de pessoa que prefere as coisas assim. Você não sabe de onde ele veio, você com certeza não esperava ele ali, mas ali ele está, sentado em sua mão de maneira artrópode e você não sabe o que fazer a respeito.
Você olha para essa criatura, fascinado. A luz encontra a carapaça
quitinosa e explode em cores que você nunca imaginou. As asas são finas e transparentes,
belas e delicadas de tal forma que os maiores joalheiros só podem um dia sonhar
em tentar imitar. É a elegante curva das antenas, a precisão dos movimentos, o
zumbido adormecedor de seu voo que te prende, como se tudo nele fosse montado para hipnotizar
os sentidos e você não consegue desviar a atenção, tentando guardar cada
detalhe na memória.
Você fita o inseto, enojado. O abdome pulsa, repleto de órgãos e líquidos que você se recusa a imaginar, mas que sabe que são viscosos e pútridos. Você nota os pequenos pelos que o cobrem seu torço, suas pernas, enquanto ele tenta, constantemente
e sem sucesso, se limpar, conseguindo apenas espalhar a sujeira de forma igual sobre seu corpo. O asco te faz engasgar. Você
sente as garras das patas prendendo a pele da sua palma e um calafrio de
repulsa corre pela sua espinha.
Você o encara, continuamente. E em sua mente você ouve um
eco, uma voz tão distante que você mal reconhece como sendo a sua própria. Uma
voz que vem de lugares escuros e esquecidos que você prefere fingir que não
existem. A voz vem e te provoca a mais terrível das curiosidades: e se você fechar o
punho, com força, apenas uma vez? Algo em você não deseja nada no mundo além da satisfação de ouvir aquele
som quebradiço, como um punhado cereal sendo esmagado. E você quer apenas para
ver acontecer. Você quer e tenta fingir que não e continua o encarando.
Você o observa, intrigado. Os olhos multifacetados encaram
diretamente os seus - e, simultaneamente, todo o resto ao redor - com uma profundidade misteriosa,
uma compreensão alienígena do mundo que mal podemos imaginar e muito menos
compartilhar. Você vê as mandíbulas desproporcionalmente grandes e de força
incrível e se pergunta se você o tem em sua mão, ou se é o contrário. Possuiria
um ferrão, longo e doloroso como uma faca? Seria venenoso? Mortalmente
venenoso? Você não sabe. Você sabe apenas das cores magníficas, dos pelos imundos, da
fragilidade em suas mãos e do gelante terror do desconhecido.